A Madeira na História da Humanidade
A Evolução do Uso e Preservação da Madeira ao Longo dos Séculos
Por Leonardo Afonso
Desde os tempos mais remotos, a madeira foi um dos primeiros materiais
utilizados pelo ser humano. Antes mesmo da descoberta do fogo ou da agricultura,
nossos ancestrais exploravam a madeira para a criação de armas, ferramentas e abrigos
rudimentares. A habilidade em trabalhar esse material foi fundamental para a evolução
humana, desde afiar gravetos com dentes ou pedras até a confecção de cabos de
machados usados pelos primeiros hominídeos.
No período Paleolítico, a madeira era usada de maneira bruta, sendo talhada e
esculpida com pedras afiadas para a confecção de lanças e utensílios básicos. Durante
essa jornada, aprendemos não apenas a manipular esse recurso, mas também a preserválo. As primeiras tentativas de conservação incluíam a carbonização superficial da
madeira ao fogo brando, que endurecia sua estrutura e aumentava sua resistência. Além
disso, gorduras animais e óleos vegetais foram usados para tratar a madeira, um
conhecimento que se expandiu ao longo da história.
Com o surgimento das primeiras civilizações, como Egito, Mesopotâmia e China
Antiga, a madeira passou a ser usada não apenas para a construção de estruturas básicas,
mas também para mobiliário, artefatos religiosos e embarcações. Isso levou ao
desenvolvimento das primeiras técnicas de acabamento, fundamentais para prolongar a
vida útil das peças e conferir-lhes um aspecto mais refinado.
Os egípcios foram uma das primeiras civilizações a dominar a carpintaria e a
utilização de acabamentos para madeira. As representações em hieróglifos e pinturas em
tumbas faraônicas mostram que os artesãos egípcios eram altamente especializados e
empregavam técnicas inovadoras para a época. Seus móveis eram sofisticados,
incluindo cadeiras, mesas e armários, com encaixes precisos e materiais nobres como
marfim e ébano para embutidos decorativos. Os acabamentos egípcios incluíam óleo de
cedro, óleos vegetais, resinas naturais, pátinas e pigmentos.
A aplicação de pigmentos era uma prática comum na antiguidade, sendo
utilizados para conferir cor e proteção às peças de madeira. No Egito, pigmentos
minerais como o ocre vermelho e amarelo, a malaquita (verde) e o lápis-lazúli (azul)
eram misturados a óleos e resinas para criar tintas duráveis. Esses pigmentos eram
aplicados sobre a madeira e protegidos com camadas de cera ou laca rudimentar.
Na região da Mesopotâmia, onde se desenvolveram civilizações como os
sumérios, babilônios e assírios, a madeira também desempenhava um papel central.
Contudo, a escassez de florestas na região obrigou os povos mesopotâmicos a importar
madeira de regiões vizinhas, como o Líbano, conhecido por seus cedros. Para aumentar
a durabilidade e a estética da madeira, desenvolveram técnicas como a aplicação de
betume misturado a pigmentos minerais, que também era amplamente empregado em
estruturas arquitetônicas.
As colas primitivas utilizadas na antiguidade também tiveram um papel
fundamental na evolução da marcenaria. Os egípcios desenvolveram adesivos à base de
colágeno extraído de peles e tendões de animais, que eram fervidos para produzir uma
cola forte e durável. Além disso, colas vegetais feitas a partir de extratos de árvores,
como a acácia, eram empregadas na fixação de lâminas de madeira em técnicas de
marchetaria. Na China Antiga, a laca aplicada em múltiplas camadas também servia
como um adesivo natural para unir superfícies de madeira e fixar incrustações
ornamentais.
Na China Antiga, o acabamento da madeira alcançou um nível ainda mais
refinado. Os chineses foram pioneiros na utilização de lacas naturais extraídas da árvore
Rhus verniciflua, uma técnica que evoluiu para a criação de peças altamente
ornamentadas e resistentes ao tempo. A laca era aplicada em múltiplas camadas e
misturada com pigmentos para conferir cores e padrões sofisticados. Essa arte se tornou
tão avançada que foi amplamente exportada para outras regiões da Ásia e,
posteriormente, para a Europa através da Rota da Seda.
Ao longo dos séculos, o conhecimento sobre o acabamento e a preservação da
madeira se aprimorou. O acesso e a diversidade de produtos eram limitados nas épocas
passadas, sendo utilizados por profissionais experientes que conheciam suas
propriedades. Entre os produtos utilizados para impermeabilização e proteção de
embarcações, destacavam-se o alcatrão e a cera. Embora ceras e resinas naturais
pudessem ser colhidas em sua forma pura, sua aplicação não era simples, levando ao
uso de óleos vegetais e gorduras animais como soluções mais práticas.
Os acabamentos a óleo se tornaram conhecidos por sua fácil aplicação e
manutenção. Diferente de outros tipos de acabamento que criam uma camada
superficial, os óleos penetram na madeira, saturando suas fibras e conferindo uma
aparência natural. Entre os óleos secativos mais utilizados, destacam-se o óleo de
tungue e o óleo de linhaça, que, quando em contato com o ar, polimerizam e criam
ligações químicas com a celulose e lignina da madeira, aumentando sua resistência.
O processo de polimerização dos óleos secativos ocorre devido à presença de
ácidos graxos insaturados, que reagem com o oxigênio do ar, formando uma estrutura
reticulada que endurece ao longo do tempo. Esse fenômeno confere ao óleo a
capacidade de criar um acabamento resistente sem formar uma camada espessa sobre a
superfície da madeira. O óleo de tungue, em particular, é altamente valorizado por sua
resistência à umidade e seu brilho característico, enquanto o óleo de linhaça é
amplamente utilizado devido à sua fácil disponibilidade e versatilidade.
Além disso, os óleos secativos podem ser combinados com resinas naturais,
como a resina de âmbar e o copal, para melhorar sua durabilidade e resistência ao
desgaste. A adição de secantes metálicos, como o óxido de cobalto ou manganês,
acelera o tempo de cura desses óleos, tornando-os ainda mais eficazes para aplicações
diversas na marcenaria.
Nossa relação com a madeira acompanha toda a história humana. Desde as
primeiras lanças endurecidas ao fogo até os tronos de faraós revestidos em ouro e os
violinos finamente trabalhados, o caminho da madeira é um percurso de aprendizado,
tentativa e erro. Em nossa jornada na marcenaria, a prática e a experimentação com
diferentes tipos de acabamento continuam sendo essenciais para garantir proteção e
beleza aos projetos. Afinal, não existe um acabamento perfeito, mas sim o acabamento
ideal para cada situação.